Nova ‘costura’ pode destravar reforma do código mineral
Em meio ao derretimento das commodities metálicas no mercado internacional, o governo já aceita moderar a proposta enviada originalmente ao Congresso Nacional para mexer nos royalties da mineração, que fazia parte de uma ampla reforma no marco regulatório do setor. A nova ideia em torno do projeto de lei é criar uma “banda de preços” para definir as alíquotas cobradas na exploração do minério de ferro e colocar o texto em sintonia com o cenário de preços deprimidos.
Em queda livre, o minério voltou ontem a romper a barreira de US$ 50 por tonelada e arrastou para baixo as ações da Vale. Sem a perspectiva de retomada dos valores acima de US$ 100 que vigoravam até 2012, o governo sinaliza que não se colocará mais como obstáculo às mudanças planejadas pelo relator do novo código de mineração, deputado Leonardo Quintão (PMDB-MG).
Quando mandou o projeto à Câmara dos Deputados, em junho de 2013, a presidente Dilma Rousseff fez questão de não fixar em lei as novas alíquotas e deixá-las para um futuro decreto. O governo argumentava que, assim, teria condições de calibrar a cobrança de acordo com a variação de preços no mercado. E estabeleceu apenas um teto de 4% do faturamento bruto no texto. Esse valor seria adotado, por exemplo, para os royalties do minério de ferro. Atualmente, a cobrança é feita sobre as receitas líquidas.
O setor privado nunca aceitou bem a ideia de deixar as alíquotas em aberto e Quintão incorporou, ainda na legislatura passada, percentuais fixos para cada minério ao projeto de lei. Diante do impasse, a tramitação do novo código simplesmente parou e a mudança no cenário de preços tirou a possibilidade de avanços.
Nas últimas semanas, Quintão diz ter costurado com o ministro de Minas e Energia, Eduardo Braga, uma alternativa para destravar o projeto. Agora, ele pretende incluir no texto quatro variações de alíquotas. Quando o minério ficar abaixo de US$ 60 por tonelada, as empresas pagariam 1% do faturamento bruto com a exploração. A alíquota subiria para 2% quando a tonelada do ferro ficar entre US$ 60 e US$ 80, iria para 3% de US$ 80 a US$ 100 e atingiria 4% somente quando o preço romper a barreira de US$ 100 – o que parece totalmente fora do radar.
Conforme explicou ao Valor uma fonte do governo, cabe aos Estados e municípios – a quem se destina, em conjunto, 88% da arrecadação total com os royalties – apoiar ou não essa fórmula. A União não deverá se opor, segundo essa autoridade, e o relator garante já ter obtido apoio de governadores e prefeitos.
No primeiro semestre, a arrecadação com os royalties da mineração foi de R$ 692 milhões e passa longe da receita de R$ 1,7 bilhão levantada de janeiro a dezembro do ano passado. Em 2013, a compensação financeira pela exploração dos recursos minerais (Cfem) alcançou R$ 2,3 bilhões e o governo tinha planos de dobrar essa arrecadação com o novo código.
Quintão quer convencer o presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), a pautar a votação do projeto até agosto, no máximo. Ele ainda não apresentou, porém, seu texto à comissão especial que analisa o tema.
Por isso, reservadamente, grandes empresas veem com ceticismo as chances reais de avanços nas próximas semanas. Um executivo do setor que acompanha a tramitação do projeto aposta em vários pedidos de vista por deputados antes de uma deliberação final.
Para as mineradoras, não é hora de falar em aumento das alíquotas. Levantamento do Instituto Brasileiro de Mineração (Ibram) aponta perspectivas de investimentos de US$ 53,6 bilhões entre 2014 e 2018. No período 2012-2016, a estimativa alcançou US$ 75 bilhões.
Se não se opõe às mudanças anunciadas por Quintão, o governo também não vê motivos para acelerar a votação. O risco, disse uma autoridade, é que a desmobilização da base aliada precipite novas alterações indesejadas. A postura seria, no fim das contas, de não brigar pelo projeto – a favor ou contra. Para esse auxiliar, o preço do minério deve ter uma discreta recuperação e chegar à faixa entre US$ 75 e US$ 80 em meados de 2016.
Fonte: Valor Econômico/Daniel Rittner | De Brasília